Com o crescimento desordenado e urbanização acelerada que aconteceram nas últimas décadas aqui no Brasil, planejar e estruturar cidades se tornou um desafio cada vez maior e relevantes desde as grandes metrópoles até as menores cidades interioranas. Trânsito congestionado, água de qualidade duvidosa, ausência de tratamento do esgoto, além da poluição de diversas naturezas, esses são apenas alguns dos problemas típicos das cidades brasileiras e para que esses efeitos sejam combatidos, o planejamento urbanístico é de suma importância para criar políticas públicas efetivas de planejamento urbano no país.
A urbanização é fenômeno globalizado que avança constante em diferentes ritmos em ao longo de todo planeta. Na década de 60, apenas um terço da população mundial viva em conglomerados urbanos, já hoje mais da metade das pessoas moram em cidades e a tendência é que até 2050, essa porcentagem ultrapasse três quartos da população global.
A América Latina é, ao mesmo tempo, uma das regiões mais pobres e ao mesmo tempo a mais urbanizada do planeta, o que traz imensos desafios. O crescimento das cidades na região se fez de maneira desenfreada, sem que os investimentos em infraestrutura acompanhassem a ocupação do solo, criando conglomerados habitacionais de infraestrutura precária e desorganizada como as favelas.
Figura 1: Imagem aérea da cidade de São Paulo, maior conglomerado urbano da América Latina.
Todavia, no que se refere ao planejamento urbano, um dos primeiros marcos relevantes no cenário nacional se deu apenas em 1930, com a elaboração de um plano elaborado pelo arquiteto francês Donald Alfred Agache. O chamado Plano Agache foi a primeira proposta de intervenção urbanística na cidade do Rio de Janeiro que levou em consideração questões primordiais como o planejamento dos transportes públicos, o abastecimento de água, a reserva de áreas verdes e a habitação em si.
A discussão sobre planejamento urbano se manteve tímida no Brasil até 1970, quando a população urbana finalmente ultrapassa a população rural e o crescimento desenfreado das cidades começa a trazer inúmeros problemas, como trânsito, violência, falta de esgoto e água tratada, entre outros. Desde então, a discussão sobre o planejamento urbano ganha fôlego, tanto nas universidades quanto na administração pública. O estado de São Paulo, por exemplo, torna obrigatória a realização de plano diretor a todos os seus municípios já em 1969.
Para que ofereça qualidade de vida para todos, o ideal é que uma cidade cresça de maneira equilibrada, com definições prévias acerca das prioridades do município e das destinações de uso de seu território, então foi para esse fim que foi criada a exigência da elaboração do Plano Diretor. Trata-se do documento-base de orientação da política de desenvolvimento dos municípios brasileiros: o Plano Diretor está previsto na Lei 10.257/01, conhecida como Estatuto da Cidade. Todos os municípios com mais de 20 mil habitantes devem elaborar um Plano Diretor, o que acaba englobando boa parte dos municípios brasileiros.
Já em 2009, oito anos após a sua aprovação, nem todos os municípios com mais de 20 mil habitantes haviam elaborado o Plano Diretor. Isso pode se dever à própria complexidade da tarefa, que pode demandar uma expertise que nem todos os municípios possuem. Já nas cidades onde um plano diretor foi discutido e aprovado, os resultados são mistos. Segundo avaliação do Ministério das Cidades, muitos planos diretores falharam em estabelecer uma habitação adequada do território municipal, saneamento básico e mobilidade urbana, entre outros.
Figura 2: Gritante desigualdade social entre a favela de Paraisópolis e o bairro Morumbi em São Paulo.
Planejar cidades não é algo simples. Primeiramente porque a cidade é um organismo vivo, dinâmico, que se constitui, se transforma e se comporta de maneiras que não podem ser plenamente previstas ou controladas por ninguém. Quem decide se você vai morar no bairro A ou no bairro B? Quem decide se você vai ao trabalho de carro, de ônibus ou de bicicleta? Quem determina o que você vai usar mais, uma praça ao ar livre ou um teatro? Nenhum administrador público tem o poder de obrigar a população em nenhuma dessas escolhas, em princípio somos livres para fazê-las dentro das nossas preferências.
O segundo grande motivo pelo qual planejar cidades não é simples é que o processo para formulação de um plano dessa natureza é sempre permeado pela disputa entre interesses conflitantes, pois a escolha por um caminho implica na renúncia a outro. Tomemos um simples exemplo: verticalizar uma parte da cidade, permitindo prédios mais altos, é bom ou ruim? Para alguns, será muito bom. Construtoras vão construir, imobiliárias vão vender e o poder público gastará menos para levar infraestrutura (água, esgoto, iluminação, transporte) à população. Para outros, será péssimo. O trânsito na região pode piorar, residentes com dificuldades respiratórias podem ter suas doenças agravadas e a vista da cidade não será mais a mesma.
Desse modo, o processo de elaboração de um plano diretor é extremamente desafiador e problemático. Há uma tradição na literatura acadêmica de que o plano diretor deve focar no nível estratégico, estabelecendo grandes linhas de desenvolvimento para a cidade. Contudo, é comum que os planos diretores fiquem apenas em diretrizes vagas, sem efeito prático, uma vez que não impõem regras claras para a ocupação do território, nem definem atributos aos instrumentos de gestão e desenvolvimento urbano. Não surpreende que, ao final do seu período de execução, observe-se que quase nada tenha sido feito.
Além de diretrizes mais amplas, é importante que o plano diretor contenha algumas disposições autoaplicáveis. Isso significa que o que está no plano diretor seja suficientemente claro para aplicado imediatamente após sua promulgação, ou então que dê direções claras para a regulamentação de instrumentos derivados dele. Por exemplo, se ele definir que haverá IPTU progressivo, que ele já aponte para as regras que serão detalhadas em lei específica posterior.
No lado oposto, estão os planos diretores que ambicionam ser muito mais do que podem, seja por estabelecer metas inatingíveis, seja por versar sobre temas que não lhe competem, chegando a impor determinações para outros entes da federação (estado e união) cumprirem – algo que nunca ocorreu no Brasil. O plano diretor deve ter metas factíveis e tratar daquilo que está dentro da capacidade do poder municipal de impor ou realizar, caso contrário já nasce sem credibilidade perante a sociedade e perante os próprios gestores públicos.
Referências
BLUME, Bruno. O que é um Plano Diretor? Disponível em: https://www.politize.com.br/plano-diretor-o-que-e/. Acesso em: 16 set. 2022.
CALEGARI, Diego. Plano diretor: como é feito e para que serve? Disponível em: https://www.politize.com.br/plano-diretor-como-e-feito/. Acesso em: 16 set. 2022. PRIETO, Immaculada. Plano diretor: como é feito e para que serve? Disponível em: https://www.politize.com.br/plano-diretor-como-e-feito/. Acesso em: 16 set. 2022. MENEZES, Murilo. Plano diretor: como é feito e para que serve? Disponível em: https://www.politize.com.br/plano-diretor-como-e-feito/. Acesso em: 16 set. 2022.
CALEGARI, Diego. Plano diretor participativo: necessidade ou ilusão?. Disponível em: https://www.politize.com.br/plano-diretor-participativo-necessidade-ou-ilusao/. Acesso em: 16 set. 2022. PRIETO, Immaculada. Plano diretor participativo: necessidade ou ilusão? Disponível em: https://www.politize.com.br/plano-diretor-participativo-necessidade-ou-ilusao/. Acesso em: 16 set. 2022. MENEZES, Murilo. Plano diretor participativo: necessidade ou ilusão? Disponível em: https://www.politize.com.br/plano-diretor-participativo-necessidade-ou-ilusao/. Acesso em: 16 set. 2022.
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